946 O que pensar do suicida que tem por objetivo escapar das
misérias e decepções deste mundo?
– Pobres Espíritos, que não têm coragem de suportar as misérias da
existência! Deus ajuda aqueles que sofrem, e não aos que não têm força
nem coragem. As aflições da vida são provas ou expiações; felizes aqueles
que as suportam sem queixas, porque serão recompensados! Infelizes,
ao contrário, os que esperam sua salvação do que, na incredulidade deles,
chamam de acaso ou sorte! O acaso ou a sorte, para me servir da
vossa linguagem, podem, de fato, favorecê-los transitoriamente, mas é
para fazê-los sentir mais tarde e mais cruelmente o vazio dessas palavras.
946 a Aqueles que conduziram um infeliz a esse ato de desespero
sofrerão as conseqüências disso?
– Como são infelizes! Pois responderão por homicídio.
947 O homem que na necessidade se deixa morrer de desespero
pode ser considerado um suicida?
– É um suicida; mas os que o levaram a isso ou que poderiam impedilo
são mais culpados que ele, e a indulgência o espera. Entretanto, não
acrediteis que seja inteiramente absolvido se lhe faltaram firmeza e perseverança
e se não usou sua inteligência para superar as dificuldades. Infeliz
dele, principalmente se seu desespero se originou do orgulho; quero dizer,
se é desses homens a quem o orgulho paralisa os recursos da inteligência,
que se envergonham por depender do trabalho de suas mãos e que
preferem morrer de fome a renunciar ao que eles chamam de posição
social! Não haverá cem vezes mais grandeza e dignidade em lutar contra a
adversidade do que enfrentar a crítica de um mundo fútil e egoísta, que
tem boa vontade apenas para com aqueles a quem nada falta, e vos dá as
costas quando tendes necessidade dele? Sacrificar a vida em consideração
a esse mundo é uma coisa estúpida, porque para esse mundo isso
não tem valor.
948 O suicídio que tem por objetivo escapar da vergonha de uma
má ação é tão condenável quanto aquele que é causado por desespero?
– O suicídio nesse caso não apaga o erro; pelo contrário, haverá dois
em vez de um. Quando se teve a coragem de fazer o mal, é preciso ter a
coragem de suportar as conseqüências. A Providência a tudo julga e, de
acordo com a causa, pode, algumas vezes, diminuir seus rigores.
949 O suicídio pode ser desculpável quando tem por objetivo
impedir que a vergonha recaia sobre filhos ou sobre a família?
– Aquele que age desse modo não procede bem, embora acredite
que o faça. A Providência leva isso em conta, porque é uma expiação que
se impõe a si mesmo. Ele atenua seu erro pela intenção, mas não deixa de
cometer um erro. Portanto, eliminai os abusos da sociedade e os vossos
preconceitos e não tereis mais suicídios.
950 O que pensar daquele que tira a própria vida na esperança
de atingir mais cedo uma vida melhor?
– Outra loucura! Se fizer o bem a atingirá mais cedo. Pelo suicídio
retarda sua entrada num mundo melhor, e ele mesmo pedirá para vir terminar
essa vida que encurtou por uma falsa idéia. Um erro, seja qual for,
nunca abre o santuário dos eleitos.
951 O sacrifício da vida não é algumas vezes meritório, quando
tem por objetivo salvar a de outras pessoas ou ser útil aos seus semelhantes?
– Isso é sublime, de acordo com a intenção, e nesse caso o sacrifício
da vida não é um suicídio, mas um sacrifício inútil. Porém, está fora dos
desígnios divinos se é ofuscado pelo orgulho. Um sacrifício é apenas meritório
pelo desinteresse. Algumas vezes, esse sacrifício esconde uma
segunda intenção, que lhe diminui o valor aos olhos de Deus.
952 O homem que morre vitimado pelo abuso de paixões que
sabia apressariam o seu fim, mas às quais não tem mais o poder de
resistir por ter se habituado a fazer delas verdadeiras necessidades
físicas, comete suicídio?
– É um suicídio moral. Deveis compreender que o homem é duplamente
culpado nesse caso. Nele há, além da falta de coragem, a ignorância
e, acima de tudo, o esquecimento de Deus.
952 a Ele é mais ou menos culpado do que aquele que tira a
própria vida por desespero?
– É mais culpado, por ter tido tempo de reconhecer seu suicídio. Naquele
que o comete de súbito existe algumas vezes uma espécie de
alucinação obsessiva próxima à loucura; o outro será punido com mais
rigor, porque as penalidades são sempre proporcionais à consciência que
se tem dos erros cometidos.
953 Quando uma pessoa vê diante de si uma morte inevitável e
terrível, é culpada por abreviar em alguns instantes seus sofrimentos
por uma morte voluntária?
– Sempre se é culpado por não aguardar o termo fixado por Deus.
Quem poderá assegurar, aliás, se o fim chegou, apesar das aparências, e
que não se pode receber um socorro inesperado no último momento?
953 a Concebe-se que em circunstâncias comuns o suicídio seja
condenável, mas suponhamos o caso em que a morte é inevitável e a
vida seja abreviada apenas por alguns instantes.
– É sempre uma falta de resignação e submissão à vontade do
Criador.
953 b Quais são, nesse caso, as conseqüências dessa ação?
– Uma expiação proporcional à gravidade do erro, de acordo com as
circunstâncias, como sempre.
954 Uma imprudência que compromete a vida sem necessidade
é repreensível?
– Não existe culpabilidade se não há intenção ou consciência positiva
de fazer o mal.
955 As mulheres que, em certos países, se fazem queimar nas
piras cinerárias1 voluntariamente junto com o cadáver do marido podem
ser consideradas suicidas, e sofrem as conseqüências disso?
– Elas obedecem a um preconceito e muitas vezes mais pela força do
que por vontade própria. Acreditam cumprir um dever, e aí não se caracteriza
o suicídio. São desculpáveis pelo pouco desenvolvimento moral da
maioria delas e pela ignorância. Esses costumes bárbaros e estúpidos
desaparecem com a civilização.
956 Aqueles que, não podendo suportar a perda das pessoas
queridas, se matam na esperança de reencontrá-las, atingem seu
objetivo?
– O resultado é completamente diferente do que esperam: em vez de
se unirem às pessoas de sua afeição, afastam-se delas por mais tempo,
porque Deus não pode recompensar um ato de covardia e o insulto que é
feito ao duvidarem de Sua Providência. Eles pagarão esse instante de
loucura com desgostos maiores que os que acreditam abreviar e não terão
mais para recompensá-los a satisfação que esperavam. (Veja a questão
934 e seguintes)
957 Quais são, em geral, as conseqüências do suicídio sobre o
Espírito?
– As conseqüências do suicídio são muito diversas: não existem penalidades
fixas e, em todos os casos, são sempre relativas às causas que
o provocaram; mas uma conseqüência da qual o suicida não pode escapar
é o desapontamento. Além disso, a sorte não é a mesma para todos:
depende das circunstâncias. Alguns expiam sua falta imediatamente; outros,
em nova existência, que será pior do que aquela cujo curso interromperam.
958 Por que o homem tem instintivamente horror ao nada?
– Porque o nada não existe.
959 De onde vem para o homem o sentimento instintivo da vida
futura?
– Já dissemos: antes de sua encarnação, o Espírito conhecia todas
as coisas, e a alma guarda uma vaga lembrança do que sabia e do que viu
em seu estado espiritual. (Veja a questão 393.)
960 De onde vem a crença que se encontra em todos os povos
das penalidades e recompensas futuras?
– É sempre a mesma coisa: pressentimento da realidade trazida ao
homem pelo Espírito nele encarnado. Porque, sabei-o, não é em vão que
uma voz interior vos fala; o erro está em não escutá-la com bastante atenção.
Se pensásseis bem nisso e mais freqüentemente, melhores vos
tornaríeis.